domingo, 19 de janeiro de 2014

Entre os Atos, de Virginia Woolf

"Entre os Atos" foi o último romance escrito por Virgínia Woolf. A autora se suicidou antes de sua publicação. 

Em resumo, o romance descreve um dia na vida de uma família e parece girar em torno de uma personagem feminina, Isa. 

Há uma peça a ser encenada na propriedade da família, e a peça trata da História da Inglaterra. A percepção da platéia a respeito das cenas é um elemento bastante importante para esclarecer a própria peça. Por exemplo, após a seguinte fala de uma personagem da peça: "Que derramem seu suor nas minas; que tussam debruçados nos teares; que suportem o seu destino. Esse é o preço de um Império; esse é o ônus do homem branco", a reação de uma das senhoras na platéia é: "-Ora, ora - admoestou a Sra. Jones -havia grandes homens entre eles... - Não sabia por que, mas sentia que haviam ofendido seu pai e, portanto, ela própria".

Naturalmente, a relação entre os membros da família é relevante para a estória. Isa escreve poemas em um caderno de contabilidade, para escondê-los do marido, e segue por todo o romance murmurando versos - as relações entre ela e o marido são percebidas como "tensas" por terceiros.

Fico aqui pensando porque, afinal, os romances que são mais sérios e de que gosto tanto precisam retratar esse rancor e essa incompreensão (um dos momentos de Isa no livro: "Pai dos meus filhos" , acrescentou, caindo no clichê conveniente fornecido pelas literaturas de ficção") que parecem inerentes a uma relação mais duradoura, principalmente quando o romance é do ponto de vista feminino. Na verdade, penso agora nos romances de Clarice Lispector e de Virginia. O único romance com final feliz de Clarice, dos que li e de que me lembro, é "Uma Aprendizagem" e parece um pouco forçado porque o personagem masculino funciona meio que como um guru da personagem feminina durante quase todo o romance, o que acaba funcionando por causa da densidade do texto de Clarice, mas quando se pensa melhor parece uma história que se conta para si mesmo, de como as coisas poderiam ser ou poderiam ter sido, porque o que se espera dos homens, como par romântico, é que eles sejam heróis. Então, talvez a sensação sufocante não seja por conta da eventual prisão monogâmica, a que os homens não parecem submetidos; de novo Isa: "Não importava a infidelidade dele. Era a dela, sempre, que importava"), mas talvez mais por conta da sensação de engano, de não se estar nos braços de um herói, ainda que um "herói casmurro", como uma das personagens se refere ao próprio marido de Isa. Claro que também importa essa impressão de que, a partir do casamento nada mais poderia acontecer,(de novo Clarice Lispector em "Perto do Coração Selvagem"), os dias passando sem nenhuma aventura, mas talvez seja mais devastador mesmo perceber que o "príncipe" afinal não existe.

Mas, voltando, a "Entre os Atos", trata-se de um romance a ser apreciado, lido com calma, saboreado, como se faz com poesia - de fato, a linguagem é muito poética mesmo, e o conjunto é todo muito bonito e instigante. Achei especialmente belo: "(...) quando voltasse para casa, para a villa vermelha entre os trigais, ela destruiria essa emoção como um tordo arranca as asas de uma borboleta". Ou: "Bart carregara a tocha da razão até sair da escuridão da caverna. Mas ela, ajoelhada todas as manhãs, protegia suas visões". 

Por fim, confesso que tive alguma dificuldade na leitura porque ando muito ansiosa ultimamente com as mudanças que pretendo na minha vida neste ano, então eu li o romance meio que aos poucos, e precisava de alguns minutos antes de conseguir me concentrar na leitura - também não consegui ler com conversas à minha volta, e normalmente isso não costuma fazer diferença. 

Em tempo, não trago minhas impressões sobre "O Quarto de Jacob", como disse no post anterior, porque não encontrei o livro antes de sair, e costumo ler muito no ônibus, que é quando tenho mais tempo e não sou interrompida. Agora vou ler "Barba Ensopada de Sangue", de Daniel Galera, do qual recebi efusivas recomendações.

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